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Paraíba

Investigação apura esquema de cartéis na venda de combustíveis na Paraíba

Os dados mostram que, nos últimos 15 anos, esse tipo de prática foi condenada em 16 cidades, somando mais de R$ 220 milhões em multas aplicadas

Da Redação do Diamante Online

17/01/2017 às 13:28 | Atualizado em 17/03/2024 às 11:21

Após um ano de sobe e desce do preço da gasolina, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) acendeu o sinal de alerta para a possibilidade de novos cartéis no setor de revenda de combustíveis. Um levantamento feito pelo Cade, ao GLOBO, mostra que o órgão antitruste investiga, atualmente, cartéis em sete cidades: Belo Horizonte, Natal, São Luís, Brasília, João Pessoa, Goiânia e Joinville. Além disso, há pelo menos seis outros procedimentos em fase de apuração preliminar, em sigilo. Os dados mostram que, nos últimos 15 anos, esse tipo de prática foi condenada em 16 cidades, somando mais de R$ 220 milhões em multas aplicadas.

O superintendente adjunto do Cade, Diogo Thomson, explica que épocas de crise e em que ocorrem reajustes no preço da gasolina criam oportunidades para que os donos de postos de combustíveis voltem a conversar entre si e vejam nesse contato uma possibilidade de combinar preços.

— Como os donos dos postos sabem que vai acontecer algo para impactar o preço, é uma janela para que eles conversem. Além disso, a crise econômica, com uma consequente diminuição no volume de vendas, pode funcionar como um incentivo para que eles se reúnam — destacou.

Ele explicou que é comum identificar cartéis em cidades pequenas e médias e em bairros de cidades grandes. Vários dos municípios condenados já foram alvo de investigação em mais de uma ocasião nesse período. É o caso de Londrina, Goiânia, Brasília e Belo Horizonte, por exemplo. O caso de condenação mais recente foi em Uberlândia, em Minas Gerais, que em 2015 teve seis pessoas jurídicas condenadas — o sindicato local e cinco postos — a pagar multas que somaram R$ 1,8 milhão.

Eduardo Gaban, especialista e autor do livro “Direito antitruste”, explica que, nos últimos anos, os cartéis na revenda de combustíveis têm estado no topo da lista do Cade, ao lado das práticas anticoncorrenciais em planos de saúde e serviços de honorários médicos. Isso porque há uma série de fatores no mercado de combustíveis que colaboram para que cartéis se formem nesse setor.

DIFICULDADE NA DETECÇÃO

Uma das razões que facilitam os cartéis é que há poucas distribuidoras no país e todas elas adquirem o combustível da Petrobras. Ou seja, é comum que os preços sejam próximos, já que vêm de uma mesma origem.

— Esse mercado possui naturalmente um paralelismo de comportamento. Por si só, ele já induz a um comportamento próximo dos agentes. A injustiça começa a surgir quando diversos agentes conversam entre si e geram um efeito artificial de uniformização de preços — diz Gaban.

Com a proximidade natural dos preços, fica mais difícil identificar quando há um cartel de fato. Além disso, leva muitos consumidores a se confundirem e registrarem denúncias acreditando haver um cartel inexistente. Todas as denúncias passam por uma triagem do Cade.

— Ao mesmo tempo em que é um mercado propício para a existência de cartéis, é muito difícil detectar. Porque o preço, que é o principal indicador, pode significar apenas um movimento natural do mercado. Um fator que costumamos olhar com suspeição é se não há um reajuste anunciado e os postos aumentam o preço nas bombas ou quando o preço do etanol aumenta em época de safra — explica Thomson, do Cade.

Para Ademir Pereira Júnior, advogado e especialista no tema, o problema é que os donos de postos podem acompanhar os preços uns dos outros e se guiar por isso, prática que não configura cartel:

— O que não pode haver é combinação. E é muito difícil saber se há combinação, por mais que se puna, é sempre insuficiente. É como enxugar gelo.

O Cade ainda aponta que o fato de a demanda por combustíveis ser pulverizada aumenta a possibilidade de ocorrência de cartéis. Na maior parte dos casos, como essa relação do cliente com o posto não é contratualizada, a capacidade de contestação de possíveis práticas anticompetitivas fica reduzida. Pereira Junior explica que, a exemplo de órgãos antitruste no exterior, o Cade tem mudado o posicionamento em relação a esse tipo de cartel. Isso é comum, segundo ele, em casos de setores que têm práticas anticoncorrenciais recorrentes. Ele cita o exemplo de Brasília, onde o conselho decidiu intervir diretamente na rede Cascol — que detém cerca de 30% dos postos no DF — e nomeou, no ano passado, um administrador provisório para a rede, como medida preventiva até que o caso seja julgado:

— O Cade já tinha punido o cartel na cidade e viu que as medidas estavam sendo inócuas, ele se formava novamente. Essa medida tomada para Brasília é uma novidade.

ARTICULAÇÃO DE SINDICATOS

Em grande parte das condenações, os sindicatos regionais são apontados pelo Cade como os articuladores do cartel, por serem uma oportunidade insuspeita de encontro entre os donos de postos. Tanto que, das 16 condenações dos últimos anos, dez delas também incluíram associações e sindicatos. Em um estudo publicado sobre o setor, o conselho avaliou que a maior parte das condenações é de mercados com associação de 50% a 94,7% de empresas locais aos sindicatos.

O conselho aponta que os cartéis são sustentados por pressão e ameaças de retaliação contra dissidentes da prática. Nos cartéis onde havia a presença de sindicatos, como os de Florianópolis e Londrina, por exemplo, “cabia a esses a tarefa de controlar o comportamento dos participantes do conluio, bem como pressionar possíveis dissidentes ou empresas que não tinham aderido ao cartel. Nos casos em que não houve participação dos sindicatos, como o de Caxias do Sul, os líderes do cartel tratavam de pressionar os demais membros e cooptar empresas entrantes para a conduta ilegal”.

Por serem frequentes em cidades pequenas, os cartéis em postos de combustível muitas vezes precisam ser denunciados ao Cade pelo Ministério Público (MP), pela Polícia Civil ou por consumidores (por meio do portal do conselho). As parcerias com o Ministério Público são comuns tanto nesse setor quanto em outros. Isso porque, muitas vezes, o MP tem mais facilidade para investigar. Um exemplo são as autorizações para quebra de sigilo de chamadas telefônicas, geralmente dadas com maior facilidade ao Ministério Público do que ao Cade.

Paraíba Rádio Blog

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