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Paraíba

Entenda por que o Ensino Integral virou polêmica na Paraíba

De acordo com o diretor do Sintep-PB, Antônio Arruda, isso prejudica os docentes que precisam de outro horário para a complementação da renda familiar ou individual.

Da Redação do Diamante Online

25/11/2017 às 11:23 | Atualizado em 17/03/2024 às 11:21

Uma polêmica vem se tornando pauta nos debates sobre a Educação na Paraíba nas últimas semanas. Alguns protestos de alunos e denúncias feitas por pais, professores e outros agentes do ensino no estado colocou em discussão a implantação do programa Escola Cidadã Integral, do Governo do Estado, que oferece à população o ensino integral em algumas escolas da rede estadual.

Esse processo de implementação da escola integral vem acontecendo desde 2015, quando o Governo Estadual anunciou um decreto que criou a Escola Cidadã Integral e instituiu o Regime de Dedicação Docente Integral (RDDI), também foco de polêmica nesta discussão. O ensino integral é uma das 20 metas do Ministério da Educação (MEC), estabelecidas no Plano Nacional de Educação (PNE). O MEC quer que até 2024, 50% das escolas públicas do país ofereçam a educação integral, de modo que atenda, pelo menos, 25% de alunas e alunos da educação básica.

Por conta desta meta e também do aporte financeiro que o Governo Federal vem dando para estados e municípios que ofereçam esta modalidade de ensino, o Governo da Paraíba, desde 2015, iniciou o processo de mudanças em algumas escolas. A partir de 2018, a rede estadual contará com 100 unidades neste modelo, atendendo a aproximadamente 35 mil estudantes de 53 municípios paraibanos, segundo dados do Governo. Atualmente, são 33 escolas integrais na Paraíba. A implantação, no entanto, vem sendo bastante questionada.

O último caso mais contundente de reação partiu da comunidade acadêmica da Escola Estadual Daura Santiago Rangel. Professores, pais, sindicato e até associações de moradores dos bairros próximos da escola, que fica no José Américo, na Zona Sul da Capital, lançaram uma carta aberta ao governador Ricardo Coutinho (PSB), pedindo que a implantação do programa Escola Cidadã Integral não aconteça já no próximo período letivo.

Na carta, a comunidade explica que a decisão aconteceu sem diálogo e que a determinação, apressada, segundo a nota, vai prejudicar muitos alunos que trabalham, cuidam de seus filhos ou fazem outras atividades no horário aposto ao da aula. De acordo com os estudantes, a Secretaria de Estado da Educação (SEE) avisou no dia 7 de novembro que em 2018 a escola entraria no programa Escola Cidadã Integral, o que gerou apreensão nos alunos e seus pais.

Aluna do 1ª ano do Ensino Médio da Escola Estadual Daura Santiago Rangel, Camila Matias analisou a situação, lembrando, além de outras coisas, que a estrutura atual da escola não é adequada para oferecer o ensino integral.

“Uma das maiores polêmicas é que não faz nem 20 dias que ficamos sabendo que vai ser assim. A maioria não vai poder ficar nesse regime, porque precisa tomar conta da casa, trabalhar, por exemplo. A escola não tem infraestrutura, tem banheiros quebrados, uma cozinha horrível, que raramente tem lanche. São oitos salas e apenas uma tem ventilador. E só um ventilador. A maioria dos pais não quer que a escola fique com o ensino integral e 90% dos alunos também. É a única escola do bairro, não deveria ser integral”, explicou.

Quem também questionou a determinação foi Edjássia Andreade, de 16 anos, que cursa o 1ª ano do Ensino Médio na Escola Estadual João Roberto Borges de Sousa, no bairro de Mangabeira, na Zona Sul de João Pessoa. Ela também relatou que a SEE definiu que a escola passaria a ser integral sem dialogar com a comunidade acadêmica. Segundo a estudante, cerca de 300 alunos devem sair das escolas por causa da mudança.

“A escola João Roberto ainda não apresenta estrutura, como ginásio, banheiros para tomar banho, alimentação, salas de descanso, sala de laboratório, entre outras coisas para poder se tornar uma escola integral. Além disso, dos 650 alunos que a escola possui, cerca de 330 devem sair. Eu mesmo vou ter que sair da escola porque faço, no horário oposto às aulas, curso do Pronatec, como muitos dos meus colegas que trabalham e outros que fazem outros tipos de cursos. Eles vão ter que sair da escola. O Governo, que deveria fazer uma escola de inclusão está fazendo uma escola de exclusão. Muitos pais que não gastavam com a passagem dos filhos para irem para escola, porque ela era próxima de casa, agora vão ter que dar dinheiro para que os filhos possam pegar ônibus para chegarem a outras escolas”, avaliou.

Além delas, alunos de outras escolas também se manifestaram contra a implementação do ensino integral em seus colégios. Um grupo de estudantes da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Olivina Olivia, que fica no Centro de João Pessoa, realizou um protesto no dia 13 de novembro em vários pontos do bairro. Estudantes do Colégio Estadual da cidade de São João do Rio do Peixe Paraíba também foram às ruas da cidade protestar, alegando que a escola não teria estrutura para funcionar em tempo integral. Veja os vídeos ao fim da matéria.

Em discurso realizado no Espaço Cultural, em João Pessoa, no dia 13 de novembro, quando foi anunciado pelo governador o aumento do número de escolas integrais a partir do ano que vem, o secretário de Educação do Estado, Aléssio Trindade, explicou como foi a escolhas das escolas que iriam passar a oferecer essa modalidade de ensino.

“A partir de 2018 serão 100 Escolas Cidadãs Integrais espalhadas pela Paraíba. Os locais foram escolhidos com base nos indicadores de violência para tentar dar outras perspectivas para os jovens. Buscamos uma educação de alto nível para os estudantes, onde eles possam reconstruir sua história e estudar não somente a parte didática, mas adquirir conhecimentos para toda a vida”, revelou.

Sindicato também questiona Governo

Na mesma linha dos questionamentos dos alunos, alguns professores da rede pública estadual fizeram duras críticas a larga implementação do ensino integral em diversas escolas paraibanas.

Além da análise em relação às condições estruturais dos colégios e do êxodo dos estudantes que terão que sair de escolas próximas às suas casas em virtude do ensino integral, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação do Estado da Paraíba (Sintep-PB) lembrou que esse processo pode prejudicar os docentes.

Isto porque os professores que passem a ficar lotados em escolas que entrem no programa Escola Cidadã Integral terão que obedecer a um regime de dedicação exclusiva. A determinação foi realizada no decreto de 2015, que também instituiu o Regime de Dedicação Docente Integral (RDDI), o qual define, dentre outros aspectos, uma carga horária de 40 horas semanais, que deve ser cumprida pelos professores obrigatoriamente na escola que ofereça o ensino integral.

De acordo com o diretor do Sintep-PB, Antônio Arruda, isso prejudica os docentes que precisam de outro horário para a complementação da renda familiar ou individual.

“A gente está insatisfeito porque a definição é de cima para baixo. Sem discussões amplas. O governo quer nos empurrar goela a baixo. Hoje temos uma jornada de 30 horas e eles querem dobrar essa carga horária para o dobro, pagando mais mil reais. A gente sabe como é a realidade dura de quem trabalha com educação. Muitos professores trabalham em escolas de municípios ou fazem outros trabalhos para poderem complementar a renda do mês. E agora eles serão obrigados a escolher em qual vai ficar e de qual vai sair”, comentou Arruda.

O diretor do Sintep-PB ainda revelou que se não houver nenhuma nova reflexão por parte do governo estadual sobre a implementação do Escola Cidadã Integral, o sindicato vai entrar na Justiça. “Nós vamos entrar com representação no Ministério Público e também acionar a Justiça. Porque para nós isso que está acontecendo é uma arbitrariedade”, avaliou.

A reportagem do Portal Correio tentou entrar em contato por dois dias seguidos, sempre no período da tarde, com o secretário de Estado da Educação, Aléssio Trindade de Barros, e o secretário executivo de Administração de Suprimentos e Logística da Educação, José Arthur Viana Teixeira, para que eles falassem sobre as críticas e denúncias citadas na matérias, mas as ligações não foram atendidas.

Ensino integral

Segundo o Plano Nacional de Educação (PNE), o ensino integral consiste em oferecer “educação básica pública, por meio de atividades de acompanhamento pedagógico e multidisciplinares, inclusive culturais e esportivas, de forma que o tempo de permanência dos (as) alunos (as) na escola, ou sob sua responsabilidade, passe a ser igual ou superior a 7 (sete) horas diárias durante todo o ano letivo, com a ampliação progressiva da jornada de professores em uma única escola”.

Além disso, o PNE exige que as escolas que ofereçam a educação integral tenham condições estruturais que proporcionem comodidade para os alunos que fiquem todo esse tempo dentro da escola, por meio da instalação de quadras poliesportivas, laboratórios, inclusive de informática, espaços para atividades culturais, bibliotecas, auditórios, cozinhas, refeitórios, banheiros e outros equipamentos.

A lei federal ainda explica que os poderes públicos e municipais devem priorizar o ensino integral em escolas que estejam localizadas em comunidades pobres ou com crianças em situação de vulnerabilidade social.

Portal Correio

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