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Brasil

Na crise, brasileiro troca cerveja no bar por consumo em casa

A produção de cerveja caiu 6,7% no primeiro trimestre, em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados da CervBrasil

Da Redação do Diamante Online

09/04/2016 às 21:24 | Atualizado em 17/03/2024 às 11:21

SÃO PAULO - O aperto no orçamento das famílias brasileiras não poupou nem a cervejinha do final de semana. A produção de cerveja caiu 6,7% no primeiro trimestre, em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados da CervBrasil, associação que reúne os fabricantes do setor. E, com a inflação em alta e a renda em queda, o consumidor mudou de hábitos. Na hora da cerveja com os amigos e a família, a ida a bares e restaurantes saiu de cena e deu a vez para o consumo em casa.

— É expressiva a queda (no consumo) fora de casa. Houve uma mudança no comportamento. Com a baixa confiança e a queda do poder aquisitivo, os volumes consumidos tiveram retração e houve migração para produtos de menor preço. O hábito de consumo também mudou, por conta do cenário de crise econômica — diz Paulo Petroni, diretor executivo da CervBrasil.

Dados da Nielsen confirmam que os brasileiros estão preferindo beber cerveja em casa, na medida em que reduziram os gastos com entretenimento — estratégia definida pelo instituto de “levar o bar para dentro de casa". Na pesquisa, realizada no final de 2015, 61% dos entrevistados disseram que iriam cortar o lazer fora de casa, e 37% afirmaram estar optando pelo consumo compartilhado (reuniões e confraternizações em casa).

— Isso explica o motivo da queda de 1,2% na cesta Nielsen de bebidas alcoólicas. Enquanto há uma aumento das vendas desses produtos no canal autosserviço (supermercados, conveniência), houve uma queda no varejo de balcão, o bar — diz Tatiane Vale, analista da Nielsen, acrescentando que essa é a maior queda para o segmento desde 1992.

Para evitar que as vendas caiam ainda mais, as cervejarias tradicionais estão estimulando o consumo via promoções e ofertas de garrafas retornáveis, nas versões 300 ml, 600 ml ou de um litro. Essas opções sempre existiram, mas eram destinadas aos bares e restaurantes. Em tempos de recessão, porém, Petroni diz que essa alternativa sai mais barata ao consumidor e, para o fabricante, significa uma margem maior.

— Há um investimento maior das empresas nessas embalagens. O consumidor abre mão da conveniência neste momento — explicou.

A VOLTA DAS EMBALAGENS RETORNÁVEIS

As embalagens retornáveis respondem por 48,7% do consumo em domicílio no Brasil, sendo maior nas regiões Norte (53,3%) e Nordeste (61,2%).

— O foco nos próximos meses será a embalagem retornável. Isso em todas as marcas tradicionais. Essa opção garante uma rentabilidade melhor — afirma Adalberto Viviani, consultor especializado no segmento de bebidas.

A Ambev, maior fabricante de cerveja no país, passou a estimular desde o ano passado a venda de garrafas retornáveis, receita que deve ser mantida ao longo de 2016. “Temos também acelerado nossa estratégia da garrafa de vidro retornável nos supermercados, impulsionando acessibilidade aos consumidores quando eles mais precisam, com melhores margens do que as latas de alumínio descartáveis", afirmou a empresa em seu relatório de resultados de 2015, divulgado no mês passado. No último trimestre, a Ambev dobrou o volume de vendas de garrafas retornáveis.

Robson Munhoz, diretor de relacionamento com o varejo da consultoria NeoGrid, lembra que varejistas e cervejarias têm negociado melhores preços também para tentar sustentar o consumo na crise.

— As pessoas estão aguardando por ofertas. Se eu não tiver ofertas desses itens, as pessoas estão preferindo não comprar — diz.

De acordo com a Neogrid, em fevereiro do ano passado, a cada cem tipos de cerveja ofertados (de diferentes marcas e embalagens), o consumidor não encontrava nos supermercados 16,65% desses itens. No mesmo mês deste ano, esse índice caiu para 11,77%, o que, segundo o executivo, mostra não só uma maior oferta de itens pelo varejo, assim como uma menor demanda do consumidor — o que evita que os produtos faltem na prateleira.

A crise também afetou as estratégias das cervejarias artesanais. Na paulista Urbana, houve uma forte migração das garrafas (que não são retornáveis) para o chope e o growler — garrafas que servem para armazenar as bebidas retiradas das torneiras de chope.

— Antes, a nossa produção de chope era de 5% do total, agora já é de 60%. Para os bares, o custo é menor, porque não têm o gasto com a embalagem, e para o consumidor também, que vai em busca de um produto de qualidade para levar para casa — disse André Concegliero, fundador da cervejaria, sobre o growler.

Segundo ele, enquanto uma garrafa de 300 ml da cerveja é vendida entre R$ 18 e R$ 20 nos bares que distribuem a marca, o mesmo volume do chope da marca sai por cerca de R$ 12.

Um dos locais em que a Urbana é distribuída é o Empório Alto de Pinheiros, tradicional ponto de venda de cervejas artesanais e importadas de São Paulo. Um dos sócios da casa, Paulo Almeida, conta que aumentaram as vendas em growlers, mas não atribui essa mudança só à crise, mas também a novos hábitos de consumo.

— Para o estabelecimento, essa venda de cerveja em uma embalagem retornável é positiva porque há um giro maior dos barris e você estará com um chope sempre fresco. Há também um apelo ecológico — disse.

classe ‘a’ busca melhor relação custo benefício

Mas ele admite que a crise afetou a forma de consumo dos clientes, em geral das classes “A” e “B”. Mesmo com poder aquisitivo maior, diz que seu público também está procurando melhor custo benefício. Houve queda da venda das garrafas tradicionais, principalmente em janeiro e fevereiro, quando distribuidores e supermercados realizaram grandes promoções para não ficar com o produto estocado.

Já na Dortmund Beer, outra fabricante artesanal, além de uma leve queda na produção, houve aumento da inadimplência dos clientes, em geral pequenos distribuidores de bebida.

— A inadimplência subiu em torno de 20%. Clientes que nunca tiveram problema começaram a atrasar os pagamentos — afirmou Maria Fernanda Grothm, diretora da empresa.

Na Colorado, a queda nas vendas foi parcialmente compensada após a venda da empresa para a Ambev, que melhorou a distribuição.

— Todo o país está sofrendo com a crise. Agora estamos crescendo um pouco menos, então a solução é buscar formas criativas de distribuir o produto e torná-lo mais acessível, mas sem perder o espírito de uma cerveja artesanal — diz Marcelo Carneiro, fundador da Colorado.

O Globo

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